O som do despertador tomou conta do quarto inteiro como uma explosão em seus ouvidos. Acordou desnorteado e se percebeu esticado na cama, onde ela deveria estar. Passou a mão pelos lençóis como se fosse encontra-la pelas dobras do cobertor, mas só conseguiu encontrar o cordão da moça, o qual deveria ter deixado cair na noite passada.
Levantou como se sentisse o peso de uma tonelada sob seu peito, esfregou os olhos tentando se acostumar como clarão das nove horas da manhã, colocou os óculos, e pisou no chão gelado. Olhou para um lado, o relógio apontada 9:00AM, olhou para o outro, a gaveta dela na cômoda dele estava aberta.
Andou até o banheiro, estranhando a própria imagem no espelho. Lavou o rosto, imaginando onde ela deveria estar. Será que era aniversário de namoro e ela estava fazendo seu café da manhã? Mas ele não comprou presente algum para ela. Torceu com todas as suas forças para que não fosse o aniversário de namoro. Será que ela foi chamada com urgência no trabalho e teve que sair correndo? Mas hoje é domingo, impossível. Sabia que a sua profissão era quase escravidão, mas não podia chegar a tanto.
A toalha dela ainda estava molhada, estendida na parede do banheiro, e sentiu ainda fresco o cheiro do seu hidratante cítrico e floral. Sorriu sem querer e teve a certeza de que em minutos, ia poder sentir esse cheiro na pele dela.
Foi até a sala, ninguém lá. Só o Pug que estava dormindo no sofá, descansando como geralmente fazia ao voltar do passeio. Pelo visto ela acordou cedo, pois deu até a volta matinal com o cachorro.
Seguiu o cheiro maravilhoso de um dos seus quitutes preferidos, que a mãe fazia para ele nos dias especiais, como aniversário ou o dia depois de ganhar a estrela na prova. E lá estava, a mesa posta, com pão de queijo quentinho, geléia de morango, suco de acerola e leite na leiteira.
Sentiu-se como um rei, mas se sentou como um mendigo, estranhando tudo aquilo. Mas onde estaria sua rainha? Ao lado das torradas, um bilhete. “Uma surpresa”, pensou.
Passou a visão, ainda um pouco embaçada, pelo papel, e viu a chamada “Meu amor” escrita. Não resistiu e teve que ler antes de aproveitar o próprio banquete.
“Meu amor.
Fiz esse café da manhã como um pedido de desculpas. Amo você mais que tudo nessa vida, e talvez esse seja meu maior erro. A dependência está acabando com a gente. Já não me vejo longe de ti, e isso me assusta. Meu maior medo é adoecer e morrer em um fim-de-semana em que você tenha viajado a trabalho. Não quero morrer de amor, mas sim viver dele. Quero um tempo para me conhecer, me re-conhecer sem você. Saboreie os pães de queijo com a idéia de que amanhã voltarei para fazer mais, do jeito que você gosta. Me deixa aprender a viver contigo, mas me dê o direito de aprender a viver sem ti. Me amo demais para morrer por outro ser humano, e isso você sabe melhor do que ninguém. Preciso aprender com o meu erro, que é te deixar, e aproveitar meu acerto, que será voltar aos seus braços como da primeira vez. Me deixa pular nua nessa água gelada, e me espera com um cobertor quentinho e tua pele para me aquecer. Sei que para mim, os dias vão passar como um zilhão de anos, mas em um piscar de olhos seremos um só outra vez.
Me perdoa, me odeia, me deixa, mas me leva contigo.
Só não esquece que de todas as maneiras que a vida nos guia, a melhor delas é o presente.
Amor teu."